Um pedaço da Alemanha em pleno Caribe

O Brasil recebeu um número alto de  imigrantes alemães durante parte do século XIX e século XX. A região onde a presença germânica é mais forte é a do Sul do país, conhecido por resguardar as tradições e a cultura da nação de origem com muito orgulho e apreço. A imigração alemã é algo bem notório e conhecido por aqui, mas o que pouca gente sabe é que a nossa vizinha Venezuela, também foi “colonizada” em parte por esse povos europeus.

Situada no alto de uma montanha bem próxima à capital Caracas, há poucos mais de 30 quilômetros do mar caribenho, a cidade de Colonia Tovar, é um pedacinho da Alemanha em plena Venezuela.

” Viver aqui é uma benção” –  proclama José Rivera com o mais largo de seus sorrisos, em uma fresca manhã de sábado na sua bem sortida barraca de frutas na praça central do povoado.  Framboesas, pêssegos, abacates, amoras… José tem de tudo.

Seu posto apresenta mais cores que a paleta de um pintor expressionista. Por isso atrai  a cada fim de semana aos turistas que visitam a Colonia Tovar.  Este agricultor de 50 anos se diz um privilegiado na Venezuela da crise.  Ele herdou  uma  propriedade que explora junto ao restante de sua família: ” Passamos toda a vida bem”, afirma. Um relato como esse é raro na Venezuela atual.

José Rivero
O vendedor de frutas José Rivera diz que a vida na Colônia é uma benção.

Passeando por suas ruas repletas de cervejarias de estilo bávaro e restaurantes que servem uma ampla variedade de salchichas com chucrut ou contemplando sua igreja  principal, dedicada a um santo católico que morreu muito antes de que os europeus tivessem  notícia da existência da América, nos custa imaginar que o Caribe está tão perto dali. Também  o casarão branco,  com grossas vigas de madeira que salpica sua verde e montanhosa paisagem lembra mais a Floresta Negra alemã do que a tropical Venezuela.

Como surgiu essa “Alemanha do Caribe”?

O velho  Ciro Enrique Breidenbach é o cronista  oficial da localidade e conhece sua história melhor que ninguém. “Até 1840, durante o  governo de José Antonio Páez, havía uma grande emigração do campo para a cidade e a produção  agrícola da Venezuela estava caindo. Devido a essa situação, o militar e geógrafo italiano Agostino Codazzi criou um plano para atrair colonos alemães para trabalharem nos campos”, conta, enquanto mostra com delicadeza de entomólogo o original do primeiro contrato de assentamento firmado com um  destes  colonos.

Martín Tovar Ponte, um dos notáveis da independência, chegou às terras que ficam a uns 2.000 metros de altura sobre o nível do mar nas que hoje se assenta a Colonia, agraciada por um clima ameno  e um solo fértil que são uma das razões pelas quais não se sente a escassez de alimentos que enfrenta outros lugares do país.

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Este documento possui o nome dos primeiros colonos da região.

Dois anos depois um  grupo de 60 famílias da  aldeia de Endingen, no atual estado alemão de Baden-Wurtemberg, em apuros depois de uma época de más colheitas, aceitaram a oferta de Codazzi e iniciaram uma travessia pelo Atlântico que os levaria às terras de Tovar. Nascia assim este lugar tão peculiar.

Codazzi queria manter os alemães afastados da população local, porque temia que o contato com os venezuelanos arruinaría seu caráter trabalhador.  Ele mesmo, que é descendente de alemães, é um exemplo vivo de que Codazzi não alcançou este propósito. Com o tempo, colonos e nativos  foram formando casais, dando lugar a uma  excepcional mestiçagem  germano-venezuelana que perdura na atualidade.

Alemães na Venezuela

Mariel Rivero, garçonete em um dos estabelecimentos típicos da localidade, é casada com um cidadão alemão e suas duas filhas tem o passaporte do país europeu.  “É muito agradável viver aqui, a Colônia me deu tudo, conta. Cabelos loiros e olhos azuis  como os seus, pouco frequentes no Caribe, abundam aqui.

São parte de um legado que os mais conscientes dos colonos, como se conhecem aos  habitantes da colônia tratam de conservar. É o caso de Carlos e Tulio Misle, pai e filho e envolvidos ambos em projetos vinculados à origem alemã da comunidade.

Mariel Rivero
As duas filhas de Mariel Rivero tem nacionalidade alemã

Tulio viajou à Alemanha para se formar e regressou para montar uma empresa de produção de vinhos e cerveja artesanal que agora tenta expandir, apesar do contexto econômico adverso do país.

“Produzir aquí uma bebida tradicional da Colônia é um orgulho”, afirma, enquanto atende aos clientes de seu negócio. Carlos, seu pai, está empenhado em salvar o “alemão colonial ” a linguagem  local que é  resultado da fusão entre o alemão e o espanhol.

“Um grupo de pessoas comprometidas com o resgate do nosso acervo cultural levou dois anos dedicando-se a escrever a gramática do alemão colonial”, conta.  Alarmados por um estudo em que se comprovam que há  cada vez menos falantes, eles decidiram unificar o dialeto para que não se perda, e produziram um manual para ofertar um curso para que os mais pequenos começem a estudá-lo em algumas escolas do município.

Um dos fatores que vem  “isolando” o munícipio é o  turismo.  Mas esta é também  uma das fontes de riqueza da Colônia. Ankeith Bracamonte sabe bem disso. Há uns anos decidiu deixar seu posto de servidor público para fundar uma agência de viagens junto a dois sócios.

“O principal atrativo é a gastronomia, que a cada fim de semana, traz  visitantes, sobre tudo de Caracas, mas também de Maracay e Valencia“, indica, referindo – se às principais  cidades da Venezuela.

gastronomia
A gastronomia alemã é um dos principais atrativos turísticos de Tovar

A imagem  habitual  em qualquer fim de semana aqui é bem diferente das filas, protestos ou mercados desabastecidos que são comuns se projetarem nos informativos internacionais quando mostram a  Venezuela.

Uma zona segura

O turismo é  também uma das chaves que explicam  as razões pelas quais, segundo seus habitantes, a Colonia segue sendo um lugar relativamente seguro apesar de localizar-se no Estado Aragua, considerado um dos mais violentos e perigosos da Venezuela.

Reinaldo, um motorista que trabalha guiando turistas , explica porquê: “O assunto da insegurança está controlado aqui: os que trabalham com o turismo fazem patrulhas civis e quando  percebemos algo suspeito reagimos, porque  não é interessante pra  gente que  a Colonia Tovar perda sua boa fama”.

E quanto aos apagões?

A Colônia também tem sorte quanto a isso.  Ao localizar-se na mesma linha de serviço de Caracas, que tem prioridade junto ao governo, os cortes de eletricidade são muito raros na localidade.

Ficou com vontade de conhecer a “Alemanha do Caribe”?  Veja no vídeo abaixo belas imagens desse lugar tão singular:

Fonte: Site BBC Mundo

 

 

 

 

 

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